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sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

O SERVIÇO MILITAR NA EUROPA - 4- Na França

Assembleia da República
Comissão de Defesa Nacional
 Relatório

das visitas e dos Encontros de uma delegação da Comissão de Defesa Nacional com as Comissões congéneres, com os Ministérios da Defesa e com as chefias militares, da Alemanha, Bélgica, Reino Unido e França, sobre o Serviço Militar, em Fevereiro e Março de 1997.
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Índice:
Introdução                                            1
1 - A Alemanha                                     4
2 - A Bélgica                                        13
3 - O Reino Unido                              17
4 - A França                                        25
5 - Conclusões                                     32

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4 - França

 Em 22 de Fevereiro de 1996, 0 Presidente da República, Jacques Chirac, apresentou aos Franceses uma plano de reforma da defesa e das forças  armadas a que deu o nome de “Uma defesa para o século XXI. Este plano não é a primeira proposta de reformulação da defesa resultante da nova moldura politica e estratégica da Europa criada pelo desaparecimento da URSS. Já antes, no tempo do Governo Baladour e da coabitação o, o “Livro Branco sobre a Defesa”, de 1994, dá testemunho de reformas e de um novo planeamento para as forças armadas francesas.
A proposta de Chirac apresenta como elemento radicalmente diferente a
profissionalização das forças armadas e fim do SMO.
O fim da confrontação bipolar engendrou também em França, a decisão incontornável, da redução dos efetivos militares e dos gastos com a defesa. Uma defesa que ficou subitamente sem o “inimigo principal”. A ausência deste representou igualmente a ausência dos constrangimentos que mantinham em banho-maria as novas ameaças emergentes e obrigou a adequação das forças armadas a estas.
O plano “Uma defesa para o século XXI” tem como objetivos principais a profissionalização das forças armadas; a redução de efetivos; aumento drástico da capacidade de projeção de forças, para um nível acima dos 50 mil homens e, por fim, mas não 0 menos importante, a redução do orçamento da defesa.
O principal papel para a defesa do território e atribuído às forças nucleares estratégicas, a “force de frape”, que funcionarão como dissuasor. Com a substituição da conscrição pela profissionalização pretende-se criar umas‚ forças armadas mais pequenas mas com maior capacidade operacional, «mais económicas’ mas com equipamentos e sistemas de armas mais modernas. A redução das despesas deverão ser atingida com uma grande redução do
número de efetivos militares, especialmente no exercito. A redução do número de militares deverão compensar os custos superiores de cada militar contratado relativamente a militar do SMO e pretende-se que permita alterar significativamente a favor do investimento, a relação deste com a despesa da rubrica de pessoal. O Governo francês crê poder atingir nas forças armadas uma otimização na relação pessoal/investimento, sem paralelo noutras forças armadas.
Um acontecimento particular teve um papel decisivo no amadurecimento
da decisão de profissionalizar as forças armadas francesas: a guerra do Golfo. A França com as suas forças armadas conscritas de 500 mil‚ homens, teve dificuldade em deslocar uma força de 12 mil efetivos e, para isso, desorganizou 53 regimentos. Em contrapartida, as forças armadas profissionais inglesas com apenas 300 mil efetivos deslocaram com facilidade trinta mil homens para o Golfo.
O propósito da extinção da conscrição, um paradigma das forças armadas francesas, não podia deixar de levantar uma grande polémica e exigir um amplo debate. E foi o que sucedeu, pelo menos no plano institucional, na Assembleia Nacional e no Senado. Estas duas câmaras procederam a um profundo debate e a audições de um extenso e diversificado leque de especialistas das forças armadas, nacionais e estrangeiras, de académicos e investigadores, de entidades oficiais e privadas.


Redução de efetivos.

Com a reforma das forças armadas, a França quer reduzir o número de militares de 500 mil para 350 mil, em seis anos, o período de transição da conscrição para a profissionalização, e quer aumentar a sua capacidade de projeção de forças no exterior para 60 mil homens.
As reduções incidirão em todos os ramos mas com maior incidência no exército, que passará de 236 mil para 130 ou 135 mil militares, equivalente a uma diminuição de 45%.
Em seis anos as forças armadas perderão os 185 mil militares do SMO e cerca de 15 mil quadros, oficiais e sargentos e serão recrutados 48 mil militares contratados e cerca de 800 civis.
Dos atuais 124 regimentos de combate deverá passar-se para 83 a 85. De acordo com a Alemanha, as tropas francesas deixarão este país e regressarão a França, exceto as que integram o Eurocorpo. No entanto, prevê-se o aumento de efetivos da “Gendarmerie”, a qual verá reforçadas as suas missões na defesa do território.
As reduções de efetivos serão acompanhadas da modernização dos equipamentos e das armas. A marinha primeiro e depois a força aérea (anos 2004/5) serão equipadas com o moderno avião Rafale. O exército será modernizado com o carro de combate Leclerc, a marinha manterá quatro submarinos nucleares operacionais em permanência no mar.
De acordo com um estudo prospetivo para os próximos vinte anos, de 1995 a 2015, prevê-se, no Exército, a redução de 9 divisões e 129 regimentos para 9 brigadas e 85 regimentos, 927 carros de combate para 420 e de 340 helicópteros para 180. Na força aérea deverá passar-se de 405 para 300 aviões de combate e de 86 para 52 aviões de transporte. Na Marinha serão retirados vinte navios de várias classes entre os quais um porta-aviões. A redução do número de armas irá, no entanto, acompanhada da sua modernização tecnológica e de maior capacidade combativa.


.Evolução do n° de militares nas FA francesas, incluindo a “Gendarmerie"
        Quadro nº 9           Ano               1990             1995              2002
                                    Militares        627.000       577.000         440.000



A redução de efetivos que o Govemo francês pretende fazer, surge com atraso em relação a muitos outros países da OTAN.
Na sequência da queda do-muro de Berlim um vivo debate surgiu entre os que exigiam “colher os dividendos da paz” e para isso exigiam uma diminuição drástica das despesas militares e os que defendiam que a França ”não baixará a guarda” e se opunham à sua redução drástica.
Acabou por não haver uma opção clara sobre as reduções a fazer e daí resultou um ritmo de diminuição de efetivos e despesas menor que noutros países da OTAN.

Quadro N.º 10



Nota: (a) só Exército e Força Aérea (b) Só Exército e Marinha (c) Inclui a Gendarmarie"

Custos Financeiros

O orçamento do Estado aprovado em 1996 incluiu a primeira lei de programação militar para a mudança.
 O estudo financeiro elaborado pela Comissão de Finanças de Economia Geral e do Plano da Assembleia Nacional Francesa, prevê que a substituição da conscrição pela profissionalização, associada às reduções de efetivos planeados, diminuirá o orçamento de defesa, a preços constantes, nos primeiros três a quatro anos, num montante pouco significativo, de 1 ou 2 biliões de francos (30 a 60 milhões de contos) mas diminuirá em 6 biliões de francos (180 milhões de contos) por ano durante os quinze anos seguintes. Após este período as poupanças diminuirão para 2 biliões de francos por ano, em consequência do aumento progressivo das pensões.
Este estudo da Comissão, coordenado por Patrick Balkany, prevê uma  poupança líquida acumulada de 90 biliões de francos, em 20 anos, com a extinção do SMO.
Para justificar a necessidade, de substituir o serviço militar obrigatório pelo  voluntariado, o Presidente da República francês, em entrevista à estação de
televisão “França 2”, em 22 de Fevereiro de 1996 -  transcrita em “Propos sur la Defense”, n° 57, Fevereiro de 1996  - sustentou que “o serviço - militar obrigatório foi criado em 1905(...) numa época em que era necessário opor peitos contra peitos...face a um perigo exterior. Esta época está completamente ultrapassada, não temos mais necessidade de militares do serviço militar obrigatório.”
Sobre o papel integrador do SMO, do ponto de vista da coesão nacional, o presidente respondeu que “Em determinada época ele foi muito útil neste
domínio porque era igual e universal. (...) Hoje como não temos necessidade de tantos homens, ele tomou-se desigual e deixou de ser universal”.

O sistema misto de recrutamento

Nos últimos anos, as forças armadas em França, como em Portugal, Alemanha, Itália, e outros países europeus da OTAN, à medida em que a duração do serviço militar obrigatório diminuía, aumentava o número de voluntários contratados. As unidades combatentes passaram a ter um peso cada vez maior destes militares contratados.


Reservas de Mobilização

A profissionalização das forças armadas prevê a criação de uma primeira reserva de mobilização de mobilização de cem mil militares, metade dos quais virão da
- “Gendarmerie_”. Metade desta reserva destina-se ao exército e a restante -metade aos outros ramos das forças armadas.
Cada regimento disporá de uma companhia de reserva, com cento e  cinquenta militares e haverá também reservistas treinados e geridos individualmente, para servirem, por exemplo, nos estados-maiores ou como técnicos especialistas em determinados sistemas de armas.

O Serviço Nacional

Enquanto em Portugal ou na Alemanha, o que é obrigatório é, exclusivamente, o serviço militar e as formas de serviço civil alternativo decorrem apenas da objeção de consciência em França desde a década de 60, que o conceito de SMO evoluiu para o conceito de Serviço Nacional - serviço prestado pelo cidadão à nação e que pode ser militar ou civil.
Prestam um serviço civil os que, por critérios determinados, são selecionados para tal fim e os que, se declaram objetores de consciência e forem aceites como tal.
Os gráficos seguintes dão-nos uma informação sobre a distribuição dos 257.838 jovens franceses selecionados para o Serviço Nacional, no contingente de 1995.

Quadro n.° 13             
                                       S. Militar                  S. Civil                     Objeção Consciência
                                      224.855                      14.634                               10.218

O Serviço militar

Quadro n.°14
Exército   S. Combustíveis   F. Aérea  S. Saúde   Marinha   Gendarmerie
 151.405            806                35.944     4.811       19.544       12 345


Quadro nº 15  Polícia       Proteção Civil      Cooperação     Ajuda Técnica
                        8.044                 650                    5.272                  668




Tenha-se em conta que nas forças; armadas francesas, além dos clássicos três ramos, exército, marinha e força aérea, existem ainda, autônomos, o serviço de saúde e o serviço de combustíveis. Por outro lado,  frequentemente a “Gendarmerie”, uma força idêntica à GNR portuguesa, é considerada como fazendo parte das forças armadas.
Na Assembleia Nacional francesa deputados de vários grupos políticos criticaram o facto de o Presidente ter apresentado, como um facto consumado, a sua decisão de profissionalizar as forças armadas e deixado ao órgão legislativo apenas uma discussão sobre o serviço nacional.
O Partido Comunista Francês e o Partido Socialista pronunciaram-se contra a profissionalização e o fim da conscrição. O Presidente contava, no- entanto”, com a maioria de deputados na Assembleia Nacional para aprovar a sua opção e foi o que aconteceu.
Para evitar um corte total com a conscrição, foi aprovado, no entanto, o “rendez-vous citoyan” de três dias. Representa a manutenção das operações de recenseamento e classificação dos rapazes, dos dezoito aos vinte anos e das raparigas que queiram apresentar-se como voluntárias para o serviço nacional voluntário. Pretende-se que seja também uma oportunidade para rastreio, no âmbito da saúde e de informação sobre a defesa, o serviço militar e formas alternativas de serviço nacional para voluntários.

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